quinta-feira, 1 de dezembro de 2016

ARTE FEMINISTA?

Há cerca de 20 anos que constatei que precisava de uma atividade física regular, com o propósito mesmo e, tão somente, de manter a respiração e a circulação em condições razoáveis de funcionamento. Depois de muitas idas e vindas de uma irregular regularidade na atividade, de práticas diversas... corrida, natação, judô, jiu-jitsu... tenho conseguido manter, ainda de forma não tão regular quanto o pretendido, a rotina de correr, de 2 a 3 vezes por semana.

Correndo consigo não só a manutenção de um condicionamento físico mínimo, mas também, por mais que possa parecer estranho, refletir sobre as coisas da vida. Avalio decisões, rotinas, situações, experiências. Elaboro estratégias e até mesmo reviso algum conteúdo acadêmico necessário para cumprir as diversas etapas que se apresentam sucessivamente. Mas, impossível concentrar a corrida somente na introspecção e reflexão pessoal, afinal, o faço pelas ruas e se não ficar atento, posso ser vitimado por algum elemento do ambiente.

Correndo na praia consegui me esquivar de crianças brincando na areia – as crianças conseguem a façanha de, na beira da praia, levantarem-se de repente e saírem correndo, normalmente na direção oposta à que olham. Correm olhando para trás o que faz com que avancem sem ver para onde vão. Um perigo.  Correndo na praia pude manter o condicionamento e o preparo necessário para o trabalho o que, muitas vezes precisei.

No asfalto as situações são curiosas também. Já quase fui atropelado, já esbarrei em pessoas quase as derrubando.  Fui atacado por um cachorro e quase fui assaltado. Escapei porque quando abordado pelo provável assaltante que saiu de um terreno baldio, do meio da escuridão e gritou apontando uma arma: "Bora! É um assalto!" Continuei correndo, ouvi o sujeito falar: “Corra não Galado!” Segui correndo e esperei o tiro que, para minha sorte não veio. O motivo, a inspiração, para estas linhas, contudo, não foi o hábito de correr. Foi algo que vi enquanto corria. 

Há cerca de um mês enquanto cumpria o meu percurso rotineiro, vi uma jovem mulher grafitando um pedaço de muro. Pedaço de muro porque é isso mesmo que ele é. Um pedaço de muro, em um canto de terreno às margens da BR, não sei se 304 ou 101, pois fica em uma das curvas do complexo de viadutos e retornos que dão acesso à Parnamirim, ponto de encontro das duas Rodovias. Pois bem, lá estava uma jovem, magrinha, grafitando o pedaço de muro. A ilustração, bem feita e bastante adiantada já é a meu ver digna de registro e pode suscitar debates que vão além do esperado pela artista, eu imagino.


Fiquei com a ideia de voltar depois ali para fotografar o grafite quando estivesse terminado e sem demora, pois imaginei, que mesmo em local isolado e de pouca visibilidade (quem vê o muro e nota detalhadamente o grafite é que passa a pé ou de bicicleta pelo local) alguém poderia intervir e apagar ou "rasurar" o grafite. Acontece que o tempo passou e eu me esqueci de fazer o registro até que ontem, quando corria no fim da tarde, percebi que o grafite já havia sido depredado. Achei curiosa a intervenção do vândalo que se limitou a depredar, a “apagar” o que julgou obsceno sem, no entanto, conseguir ocultar a mensagem ali desenhada.

A artista desenhou  um claro, pelo menos para mim, “manifesto feminista” contemporâneo e conectado com o estilo de vários outros grafites que tem pela cidade . O que me levou a pensar: E se fosse feito um grafite com a mesma situação sendo que com um homem? Seria visto como um manifesto à masculinidade? Ou seria percebido como algo de gosto duvidoso, ou um manifesto ao machismo? As palavras por si só já remetem a significados estranhos. Machismo antagoniza o Feminismo? É então o feminismo violento? Enfim. Fica a imagem aí para quem quiser ver, conhecer, opinar, xingar, criticar... está em um muro, pouco notado. Estou ajudando a artista a ter visibilidade (se não a quisesse não faria sua intervenção em via pública).

Rodrigo Maribondo

RETOMANDO

Depois de pouco mais de 2 anos sem qualquer manifestação por aqui, voltando e, dessa vez, espero mesmo que de verdade.
Vamos ver.

Rodrigo Maribondo

quinta-feira, 30 de outubro de 2014

CÉREBROS COZIDOS

Recorrentemente tenho sido acometido de leves surtos de melancolia. Não no sentido triste da palavra, mas no aspecto saudosista da coisa. Nestes momentos de devaneio, sempre que volto à Potilândia, e volto quase que todos os dias, ocorre a lembrança e a observação, já expressas em texto que inadvertidamente se perdeu em algum HD formatado, de que as ruas da infância mesmo estando todas no mesmo lugar e tendo já algumas novas onde antes não havia nada senão mato, passaram por transformações que demonstram a mudança do poder aquisitivo, da idade de seus moradores, da tranquilidade que privilegiava seus habitantes e das árvores que sombreavam e refrescavam os dias, não raros, quentes da cidade do sol.

O fato é que o ritmo da vida na cidade está muito mais acelerado. Não percebo mais, nas ruas do bairro, os bandos de meninos andando pelas ruas e explorando os jambeiros, cajueiros, pitombeiras, castanholas, cocos e azeitonas pretas do bairro. Brincando de jogar “biloca”, de polícia e ladrão, de “tica”, soltando pipas, “caçando lagartixas” pelos terrenos baldios ou jogando mirim, “cruzamento”, cascudinho, rebatida, gol de dentro, brincando de peia quente, sarrafo ou garrafão. Se ainda existem estes jogos e brincadeiras eu não sei. Não vejo mais acontecendo como e tanto quanto antes. E era sadio. Raramente alguém brigava, muitas vezes alguém se machucava, arrancava um “chaboque” do dedão ou se queimava na urtiga. Tudo normal. Mesmo nas brincadeiras mais “pesadas” o clima não era tenso.

Hoje, acredito, além do fator tecnológico, entrou em cena o fator violência urbana. Não dá mais, mesmo se a criança estiver equipada com o localizador (celular), para ficar solta na rua, brincando à vontade porque há verdadeiramente o risco de se tornar vítima de alguma maluquice ou atrocidade típica da vida urbana contemporânea.  O próprio celular (objeto desejado desde muito, muito cedo nos dias de hoje) se converte de “instrumento de controle, tranquilidade e localização” admitido por pais um tanto neuróticos, em objeto de consumo do bandido. Veja que contradição interessante. Àquilo que deveria servir para dar a sensação de controle e segurança aos pais acaba se transmutando em objeto de cobiça e motivação da ação delinquente.

Potilândia em particular deixou, com o passar de alguns anos, não muitos, mas alguns, de ser um lugar sossegado. Quando por lá cheguei, em 1982 era um bairro afastado, com grande número de terrenos baldios, vizinho do Campus da UFRN e de Nova Descoberta. Não existiam edifícios em seu entorno, nenhum mesmo, e existiam campos de areia usados pela molecada e árvores, muitas árvores. As mesmas que foram citadas no segundo parágrafo, que além de proporcionarem o alimento e o lanche da tarde e às vezes da noite, permitiam o justo refresco sob suas sombras. Era comum que as pessoas cuidassem das árvores, quase que uma por casa nas ruas do SESC e usufruíssem das suas sombras nos finais de semana e finais de tarde. Talvez a possibilidade de ir avançando por “lanço”, de sombra em sombra pelas calçadas, somado é claro a todos os demais e inúmeros elementos que se transformaram com o tempo, contribuísse para uma perspectiva mais tranquila de se encarar o dia a dia.

O bairro hoje, que não é nem bairro é conjunto, tem poucas, pouquíssimas árvores. As ruas que anteriormente tinham quase uma árvore por casa não tem, muitas vezes, nenhuma árvore que seja. Foram todas derrubadas em nome da expansão da área construída ou para não ter o trabalho de limpar as folhas. O calor por consequência lógica e direta só aumenta. Aumenta pela ausência das sombras das árvores. Aumenta pelo aumento das áreas asfaltadas. Aumenta pela maior quantidade de carros circulando e poluentes sendo lançados na atmosfera. Aumenta com o crescimento do buraco na camada de ozônio, com a verticalização da cidade, com o crescimento da indústria e com o derramamento de sangue, prática crescente e frequente nas terras potiguares.

O resultado de tudo isso, de todo esse aquecimento da temperatura ambiente e da aceleração do ritmo de vida é, entendo, uma significativa perda na qualidade de vida. Vivemos mais apressados, mais preocupados, mais conectados, mais automatizados e perdemos o tempo de devanear. Perdemos o tempo de ouvir o silêncio, de observar a natureza, de sentir a brisa à sombra das árvores afinal, nem existem mais as árvores. Além de tudo, de todas as mazelas e atribulações da vida moderna, temos hoje, em Potilândia e nos outros conjuntos residenciais com semelhantes características, a possibilidade de literalmente, cozinhar o cérebro nos deslocamentos necessários ao cumprimento das tarefas cotidianas. Cozinhamos o juízo permanentemente em nossos deslocamentos em nome da modernidade, do conforto, do menor trabalho e da clausura doméstica. Saímos das ruas, que hoje são insalubres e hostis, nos prendemos em casa, conectados ao mundo via internet e cozinhamos os cérebros se não pelo sol causticante das ruas sem sombras, pela radiação dos celulares, tablets, fones de ouvido e outras fontes portáteis de energia e comunicação.

Rodrigo Maribondo



terça-feira, 27 de agosto de 2013

Iniciando os trabalhos

Este espaço é resultado da necessidade de expressar alguns pensamentos, exercitar a escrita, promover discussões, apresentar denúncias, publicar poesias, contos, realidade e ficção. Tem o propósito de funcionar como uma praça pública, onde qualquer pessoa tem a liberdade de abrir o bocão e dizer o que pensa, o que acha, o que acredita.

Tem apenas a pretensão de não morrer na praia. De sobreviver, se é que se pode usar a expressão para o mundo virtual, à velocidade das informações e ao imediatismo tão comuns a nossa contemporaneidade. E o compromisso de, pelo menos inicialmente, realizar postagens mensais. Quando a coisa ganhar ritmo, quinzenais, semanais até, quem sabe, diárias.

Estamos começando. Sem compromisso e sem covardia.
Que o futuro nos favoreça.